No presente artigo sustenta-se que as Lettres Portugaises não são redutíveis
à sua dimensão literária e permitem, em virtude da sua peculiar composição,
aceder a temas e confl itos inerentes à transição para a sociedade moderna.
A sua contribuição para o desenvolvimento do romance epistolar é frequentemente
notada, sublinhando-se como a narração da vivência da paixão garante
um acréscimo de autenticidade desse género literário. À margem da questão
autoral, o texto é exemplar da função do romance não como representação ou
mimesis da realidade mas como espaço de criação assente na forma autobiográfi
ca de narração. Nas Lettres é a partir da conjugação entre as observações
em primeira e em segunda ordem que se articulam formas pré-adaptativas
fornecidas pelo amor-paixão. Sustenta-se que a excepcionalidade das Lettres
depende da verosimilhança da sua apresentação dos movimentos da paixão,
em conformidade 1) com a imposição gradual de um novo paradigma fi siológico,
2) a evolução da Psicologia moral ao longo do século XVII e 3) com o
avanço da estética literária com recurso à observação de segunda ordem. Parte
de um conjunto mais vasto de mutações sociais, a constituição de um código da
intimidade depende da valorização da “interioridade” subjectiva e sua observação
do acoplamento entre a sensibilidade, sentimento e emoção (paixões da
alma) e suas formas sociais.
Autor
Carvalho, Cláudio Alexandre
Outros Autores
Universidade de Coimbra. Faculdade de Letras (ed. lit.)
Palavras-chave
Semântica do amour-passion,
Literatura epistolar,
Sensibilidade,
Melancolia erótica,
Terapia,
Semantics of passionate love,
Epistolary literature,
Sensitivity,
Erotic Melancholy,
Therapy